d) Estrutura social
da cidade
Depois destas
recordações dos factos geográficos citados, debrucemo-nos sobre a estrutura
social e sobre a actividade funcional da cidade. No decurso dos oitenta anos do
século, a evolução social, embora não se tenha traduzido pelo desaparecimento
de classes de base económica, tem conduzido, ao aumento numerário da classe
média e até à uniformização da indumentária das pessoas, o que simboliza a
instalação na consciência social de tendências igualitárias. No período que
antecedeu a primeira guerra mundial as diferenças das condições de vida do
proletariado, da classe média e das classes superiores eram mais acentuadas,
facto que se reflectia na segregação bem marcada que se estabelecia em centros
de convívio como, por exemplo, nas sociedades recreativas onde a selecção dos
sócios era muito mais rigorosa do que é hoje. Assim, o Club Farense, só admitia
proprietários abastecidos, comerciantes importantes e diplomados com cursos
superiores, o Grémio Popular de Faro e a Sociedade dos Artistas eram
associações das classes inferiores, dos que usavam frequentemente um fato de
trabalho. Havia os senhores de colarinho engomado e as senhoras de chapéu; as
mulheres do povo usavam um chaile pelos ombros e um lenço na cabeça; as de
situação económica um pouco mais desafogada usavam mantilha.
No nosso
tempo, as condições residenciais das pessoas continuam a depender da sua
posição económica e não apenas do número de componentes familiares e do tipo de
trabalho social que estes executam. Com mais forte razão, nos princípios do
século a estrutura das moradias e suas condições higiénicas eram o equivalente
da acentuada diferenciação social.
Nos primeiros
decénios do século, eram raros os prédios de dois andares. Na zona baixa, como
já disse, havia muitos de primeiro andar, embora entre estes houvesse casas
térreas, tal como sucedia na Rua Direita (conselheiro Bívar, na da Cadeia
(Filipe Alistão) e a até na de Santo António. As habitações térreas nem sempre
eram muito pequenas: algumas chegavam a ter, além da cozinha, mais três ou
quatro divisões. Uma moradia deste último tipo custava a renda mensal de quinze
tostões (1500 réis) aproximadamente. Se nos lembrarmos que no tempo da
Monarquia e primeiros anos da República o salário diário de um trabalhador
variava entre 250 e 350 réis, chega-se à conclusão de que para o pagamento da
renda de moradia eram precisos cinco dias de trabalho, mais ou menos. Os que viviam
de trabalho acidental, tinham de morar em casas mais pequenas e portanto mais
baratas.
Os proventos
familiares derivam do trabalho do chefe de família, pois só as mulheres de
famílias de recursos muito débeis trabalhavam fora de casa em serviços
remunerados.
Tal situação da mulher constituía um ideal de
vida e o trabalho fora de casa era um signo de inferioridade. No entanto a
partir do fim do primeiro decénio do século os velhos ideais do viver familiar
entram em declínio: as raparigas, embora em pequeno número, começaram a
frequentar os liceu, e desde anteriormente as escolas do magistério primário.
O trabalho
doméstico, nas classes intermédias, era, frequentemente, auxiliado por uma “criada
de servir”. As classes superiores utilizavam várias. Tratava-se de um pessoal
de trabalho mal remunerado, sem horário de prestação de serviços, sem férias e,
muitas vezes, mal instalado nas casas dos respectivos patrões.
José Neves
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